segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Fanatismo


"Minhálma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és se quer razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio do Fim!..."



(Florbela Espanca)

domingo, 30 de janeiro de 2011

Dois ou três almoços, uns silêncios.

Fragmentos disso que chamamos de "minha vida".

Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo 
presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.



Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.



Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Peixes*. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.



Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: Mas ambos estavam comprometidos.



Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.



De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia.



Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.



Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.


(Publicado no jornal "O Estado de S. Paulo", 22/04/1986)

Caio Fernando Abreu, e suas pequenas epifanias.

* No texto original lê-se Libra.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Um pouco de calor.




Ney sempre um luxo! Adoro!

"A noite daqui é tão linda e faz me perder
Penso num belo horizonte em poder te ver
Sei que eu não tenho mais nada a perder
Se eu não tenho mais nada a perder
No meu peito eu tenho você
É nessa estrada que eu quero estar
Eu quero o dia, a noite e o mar e cantar...

... Onde está você meu amor?
Eu preciso de um pouco de calor."



quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Só tinha de ser com você.






É, só eu sei
Quanto amor eu guardei
Sem saber que era só prá você
É, só tinha de ser com você
Havia de ser prá você
Senão era mais uma dor
Senão não seria o amor
Aquele que a gente não vê
O amor que chegou para dar
O que ninguém deu pra você
É, você que é feito de azul
Me deixa morar nesse azul
Me deixa encontrar minha paz
Você que é bonito demais
Se ao menos pudesse saber
Que eu sempre fui só de você
Você sempre foi só de mim
Que eu sempre fui só de você
Você sempre foi só de mim.
(Tom Jobim)
Claro que tinha de ser ele, que me enche de orgulho, que me faz feliz, dono das melhores surpresas imagináveis, dono do meu coração, da minha alma...
Todo o meu amor, é dele!

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Prelúdios-Intensos para os desmemoriados do amor.

Parte III


Contente. Contente do instante
Da ressurreição, das insônias heróicas
Contente da assombrada canção
Que no meu peito agora se entrelaça.
Sabes? O fogo iluminou a casa.
E sobre a claridade do capim
Um expandir-se de asa, um trinado

Uma garganta aguda, vitoriosa.


Desde sempre em mim. Desde
Sempre estiveste. Nas arcadas do Tempo
Nas ermas biografias, neste adro solar
No meu mudo momento

Desde sempre, amor, redescoberto em mim.


por: Hilda Hilst

(Extraído do livro: Júbilo memória noviciado da paixão, 1974.)

domingo, 23 de janeiro de 2011

Alento.



Quando nada mais houver,
eu me erguerei cantando,
saudando a vida
com meu corpo de cavalo jovem.
E numa louca corrida
entregarei meu ser ao ser do Tempo
e a minha voz à doce voz do vento.
Despojado do que já não há
solto no vazio do que ainda não veio,
minha boca cantará
cantos de alívio pelo que se foi,
cantos de espera pelo que há de vir.


( Extraído do livro Caio Fernando Abreu-  Caio 3D, O Essencial da Década de 1970, p.144)




Caio é assim... Essa coisa irresistível! 





Mais uma pedra!



"...Eu quero que você venha comigo, todo dia! Todo dia! ..."

sábado, 22 de janeiro de 2011

Seu olhar.

Têm o mesmo título, letras diferentes, compositores diferentes. E as duas: geniais em todos os aspectos.


"Temos rotas a seguir
Podemos ir daqui pro mundo
Mas quero ficar porque
Quero mergulhar mais fundo
Só de me encontrar no seu olhar
Já muda tudo
Posso respirar você
E posso te enxergar no escuro
Tem muito tempo na estrada
Muito tem
E como quem não quer nada
Você vem
Depois da onda pesada
A onda zen
É namorar na almofada
E dormir bem
Foi o seu olhar
O que me encantou
Quero um pouco mais
Desse seu amor... "
(Seu Jorge- Seu olhar)
.
.
"Gosto quando olho pra você
Gosto mais quando seu olho vem
Na direção do meu
Na direção do meu
Na direção do meu
Gosto ainda mais quando esquecemos
Onde estamos e olhando em volta escolhemos
A mesma coisa pra olhar
A mesma coisa pra olhar
A mesma coisa pra olhar
Gosto quando olho com você o mundo
E gosto mais do mundo quando posso olhar pra ele com você
Gosto mais do mundo quando posso olhar pra ele com você
Gosto mais do mundo quando posso olhar pra ele com você
Na direção do meu
Na direção do meu
A mesma coisa pra olhar
A mesma coisa pra olhar
Gosto mais do mundo quando posso olhar pra ele...com você."
(Paulinho Moska- Seu olhar)
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E claro, elas têm ouvidos certos como destino principal! ; )

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Valsinha

Um dia, ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto, convidou-a pra rodar
E então ela se fez bonita como há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça, foram para a praça e começaram a se abraçar
E ali dançaram tanta dança que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade que toda cidade se iluminou
E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu
Em paz



(Chico Buarque e Vinícius de Moraes)


Contemplando o que pra mim, se trata de autêntica arte...

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Minha querida... não se engane ao achar que você é suficientemente boa: porque não é!

Quando amanhecer.


Quando amanhecer será
Para iluminar você
Vai anoitecer o dia
Se não vier
Mas se for presente
Tudo iluminará
Meu humor, meu coração
Como deve ser se
Ser como Deus quer for
Milagre, resignação
Roupa colorida
Alegria às vistas,
indescência, indiscrição
Seu cheiro me achando
Minh'alma perdida
Direi que é céu no chão
Quando anoitecer será
Para te fazer dormir
Estrelas que nem brilhantes
Pra te vestir
Vai saber que Deus fez
As damas da noite
Preparando o seu buquê
Como vai dizer não
Se tudo o que eu vejo
Está aqui pra te servir
A mais bela roupa
Roupa de ir à festa
Coloquei pra te esperar
Disco na vitrola
Uma vela acesa
E a lua mais cheia
Quando o sol nascer será
Para desenhar você
Ou será que virá pro sol nascer.
(Vanessa da Mata)
É tanto amor...mas tanto!

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

 "Há momentos na vida em que sentimos tanto a falta de alguém que o que mais queremos é tirar essa pessoa de nossos sonhos e abraçá-la."


Clarice Lispector.


De volta ao meu quarto: um universo de sonho e planos!

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

"I cry my eyes out every time I hear your song
I hope this path leads me back where I belong
I walk along the lonely road"


(Everlast- Lonely Road)


Tô indo mas volto, morrendo de saudades e louca pelo seu amor!



terça-feira, 4 de janeiro de 2011


"No City Colleger de Los Angeles, logo antes da Segunda Guerra Mundial, eu me fazia de nazista. Mal sabia distinguir Hitler de Hércules, mas não me importava nem um pouco. O negócio é que ficar sentado na sala de aula ouvindo todos aqueles patriotas discursando sobre como deveríamos atravessar o oceano e acabar com tudo aquilo me entediava profundamente. Decidi fazer oposição. Não me dava sequer ao trabalho de ler sobre Adolf, simplesmente vomitava qualquer coisa que me parecia maléfica ou insana.
A verdade é que, de fato, eu não tinha nenhuma crença política. Era apenas uma maneira de me libertar daquilo tudo. Você sabe, algumas vezes, se um homem não acredita no que está fazendo, ele pode fazer um trabalho muito mais interessante, porque ele não está emocionalmente envolvido em sua Causa. [...] Eu levantava durante a aula e gritava qualquer coisa que me viesse à cabeça. Normalmente tinha alguma relação com a Raça Superior, o que me parecia ser bem engraçado. Não falava diretamente dos Negros e dos Judeus, porque via que eles eram tão pobres e perdidos quanto eu era. [...] Ficava surpreso ao perceber a quantidade de pessoas que me ouviam e quão poucas entres elas, se é que alguma, ao menos questionava minhas afirmações."

Bukowski – Ao sul de lugar nenhum.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

(re) Encontro.

“Sabia, gosto de você chegar assim, arrancando páginas dentro de mim, desde o primeiro dia.”
                                                                                                                                         (Chico Buarque)

Ele veio e uniu todos os fragmentos do oco que reinava dentro de mim...
Tinha nada em mim, porque as cicatrizes eram externas... No interno, era somente o NADA; doía não sentir nada, não pensar em nada, não querer nada!
Ele chegou com uma paisagem nos olhos, um tanto quanto descrentes, mas era a paisagem mais bonita que eu havia visto...
E eu, um tanto quanto surpresa por ver essa chegada repentina, tremi, suei, gaguejei... Eu enxerguei que na verdade já o conhecia de outras estradas, de outro momento, em outro corpo, talvez...  Era ele, sempre foi... O homem que me faria preencher o vazio, o oco, o nada.
Ele é de uma postura firme, voz firme, palavras firmes, eu não me lembrava mais disso.
Me encantei pelo homem que me viera (re) encontrar.
Ele me (re) conheceu, me abriu seu melhor sorriso, e então eu estava lá: diante do meu homem, contemplando a paisagem daqueles olhos e aquele sorriso de Sol me iluminou.
Com ele, me sinto viva, quente, inteira, preenchida, completa. Não me falta nada. Não existe mais vazio, nem disritmia. Tenho motivos, razões, planos e propósitos. Ele me dá aconchego, alento, proteção. Ele tira de mim a agonia, o pessimismo e a inquietação. Fico calma, serena, doce. Não há mais aridez, amargura nem omissão.
Ele tem a mim até pelo avesso.  Conhece, respeita, valoriza, deseja, ama.
Nos temos por inteiro. Somos inteiros. Vivos um para o outro. Amando sem fim.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Everlast- Dirty




Isso, claramente, me faz lembrar meu AMORZÃO, VIRILZÃO! (hehe)

Voltando as raízes... [2]

"É este o problema com a bebida, pensei, enquanto me servia dum copo. Se acontece algo de mau, bebe-se para esquecer; se acontece algo de bom,bebe-se para celebrar, e se nada acontece, bebe-se para que aconteça qualquer coisa."



(Charles Bukowski, o meu favorito)




 

Voltando as raízes...

"Qual é a sua estrada, homem? - a estrada do místico, a estrada do louco, a estrada do arco-íris, a estrada dos peixes, qualquer estrada... Há sempre uma estrada em qualquer lugar, para qualquer pessoa, em qualquer circunstância. Como, onde, por quê?"


(Jack Kerouac)

Vê se fica bem...




"Vê se fica bem, meu bem
Vê se dorme bem, meu bem
Pois não estarei pra te cuidar
Nem pra te mimar
Vê se fica bem, meu bem
Vê se come bem, meu bem
Pois não estarei pra te cuidar
Nem pra te salvar"

(Vanessa da Mata)

2011, GO! GO!

"Quando se sente amor, tem-se uma funda ansiedade. É como se eu risse e chorasse ao mesmo tempo. E vem o medo, que essa felicidade não dure."

(Clarice Lispector)

E meu desejo para 2011 é AMOR!